"O colonizador que governava o país
fazia isso através do uso exclusivo de sua própria língua, assim como utilizava
exclusivamente sua própria moeda para gerir a economia, sob a guarda exclusiva
de seu próprio exército. A colonização é, portanto, um sistema abrangente de
governança, onde a política linguística, longe de ser inocente, ocupa um lugar
de destaque na dominação de uma comunidade ou nação. Por outro lado, os
africanos devem perceber que, no processo de emancipação do continente, essas
línguas maternas ocuparão o mesmo lugar central... e todas as consequências
devem ser consideradas!" ~ Cheikh Anta Diop
Língua e Colonização: Uma Ferramenta de Dominação
Mais de seis décadas após a independência, muitas nações africanas continuam fortemente influenciadas pelas línguas de seus antigos colonizadores—inglês, francês, espanhol e português. Essas línguas estrangeiras permanecem como idiomas oficiais na governança, na legislação, na educação e nos assuntos econômicos, apesar de serem dominadas por apenas uma minoria. Enquanto isso, as línguas africanas—faladas pela maioria—são marginalizadas, restritas a contextos informais como ruas, mercados e comunidades rurais.
O Fosso Linguístico: Um Obstáculo ao Progresso
Como pode ocorrer um desenvolvimento econômico, social, cultural ou intelectual significativo quando a maioria dos cidadãos não consegue compreender ou participar dos assuntos nacionais críticos? Não é evidente que a língua utilizada na governança e na educação influencia diretamente o progresso de uma nação?
Unidade Linguística: Um Catalisador para a Coesão Nacional e Identidade na
África
Felizmente, vários países africanos demonstram o poder da unidade linguística por meio da adoção de línguas nacionais. A Etiópia, que preservou sua identidade cultural e linguística sem o legado da dominação colonial, serve como exemplo, juntamente com nações da África Oriental e Austral, como Tanzânia, Quênia, Uganda, Ruanda, Burundi, Zâmbia e República Democrática do Congo. Nesses países, línguas africanas como o kinyarwanda, o kirundi, o lingala e o kiswahili promovem a coesão nacional e o progresso.
Além disso, Mali e Burkina Faso se
afastaram do francês como língua oficial, refletindo uma mudança em direção à
valorização da identidade nacional.
Cheikh Anta Diop: Visionário da Emancipação Linguística Africana
Cheikh Anta Diop (1923-1986), conhecido como o "Faraó do Conhecimento", foi um historiador, antropólogo, egiptólogo e físico pioneiro do Senegal. Desde sua juventude, Diop demonstrou uma paixão por línguas africanas, chegando a inventar seu próprio alfabeto ainda no ensino médio.
Em sua obra seminal, "Nações e Cultura Negras: Da Antiga Antiguidade Egípcia Negra aos Problemas Culturais da África Negra de Hoje", Diop demonstrou cientificamente a afinidade entre as línguas africanas e o egípcio antigo, provando sua capacidade de expressar ideias complexas, desde a matemática até a poesia. Ao longo de sua vida, as pesquisas linguísticas de Diop refutaram alegações que desvalorizavam as línguas africanas e negavam suas origens no Egito antigo.
Empoderando o Desenvolvimento através da Governança Multilíngue e da
Educação
Em "África Negra: A Base Econômica e Cultural para um Estado Federado", Cheikh Anta Diop defendeu uma política de desenvolvimento que inclui as línguas africanas na educação e na administração. Ele rejeitou a ideia de uma única língua africana, propondo, em vez disso, que as línguas africanas modernas fossem adotadas para a governança e a educação, com as línguas indígenas servindo para regiões específicas.
Diop enfatizou que a alfabetização nas línguas nacionais é crucial para permitir que os indivíduos contribuam de forma significativa para o desenvolvimento nacional.
O Poder da Educação na Língua Materna: Estimulando a Autoconfiança e o
Crescimento Cognitivo
Os sistemas educacionais atuais frequentemente desencorajam o uso das línguas maternas, o que leva a uma queda na autoestima das crianças que são penalizadas por falar suas línguas nativas. Cheikh Anta Diop argumentou que as crianças aprendem de forma mais eficiente em suas línguas maternas. Ele apresentou evidências de que as crianças africanas demoram seis anos para entender certos conceitos em uma língua estrangeira, mas os aprendem muito mais rapidamente em suas línguas nativas.
Estudos mostram consistentemente que a educação precoce na língua nativa de uma criança melhora a compreensão e o desenvolvimento cognitivo.
Desmascarando Mitos: A Versatilidade das Línguas Africanas na Educação
Moderna
Alguns críticos argumentam que as línguas africanas são inadequadas para ensinar conceitos científicos ou econômicos modernos devido à sua diversidade linguística e à falta de um alfabeto escrito. No entanto, em seu livro "Nações e Cultura Negras: Da Antiga Antiguidade Egípcia Negra aos Problemas Culturais da África Negra de Hoje", Cheikh Anta Diop refutou eficazmente essa alegação ao traduzir princípios científicos complexos, incluindo a teoria da relatividade, para o Wolof, demonstrando a capacidade da língua de expressar conceitos avançados.
Ele também destacou a tradução da Bíblia, um documento volumoso, para várias línguas africanas como evidência de sua capacidade de transmitir ideias complexas. Além disso, suas contribuições para o estudo da gramática do Wolof e do Serer evidenciaram a riqueza e adaptabilidade das línguas africanas.
Identidade Cultural e Crescimento Econômico: Lições da Coreia e do Vietnã
A Coreia, tanto do Norte quanto do Sul, possui profundas conexões com a cultura chinesa, especialmente no uso histórico do Chinês Clássico para documentos oficiais e comunicação acadêmica. No século XV, o Rei Sejong, o Grande, introduziu o Hangul, o alfabeto coreano, como uma medida transformadora para melhorar a alfabetização entre a população em geral. O sistema de escrita existente, baseado nos caracteres do Chinês Clássico, era complexo e desafiador, especialmente para aqueles sem formação em estudos clássicos. A criação do Hangul representou um avanço crucial, estabelecendo um sistema de escrita único, projetado para refletir e atender à língua coreana em si.
De maneira similar, o Vietnã, assim como muitos países africanos, foi uma colônia francesa. Após conquistar a independência, o governo vietnamita decidiu substituir o francês pelo vietnamita como língua oficial. Além disso, adotaram o alfabeto baseado no latim, conhecido como alfabeto vietnamita ou Quốc Ngữ, substituindo o sistema anterior baseado em caracteres chineses.
Hoje, o vietnamita é a língua oficial, e o alfabeto baseado no latim é amplamente utilizado no Vietnã, destacando os esforços do país para estabelecer sua identidade cultural e linguística pós-independência.
Tanto a Coreia quanto o Vietnã experimentaram avanços tecnológicos e econômicos notáveis, refletindo suas bem-sucedidas adaptações culturais e linguísticas.
Preservando a Identidade Cultural através da Educação na Língua Materna
Para transmitir efetivamente os valores sociais, a educação deve estar enraizada em línguas profundamente incorporadas nas culturas locais. As línguas estrangeiras muitas vezes não conseguem transmitir as nuances e complexidades dos valores culturais africanos.
Priorizar a educação na língua materna garante que as futuras gerações compreendam e abracem seu patrimônio, preservando a identidade cultural e os valores sociais.
As línguas maternas não são apenas ferramentas de comunicação, mas portadoras de identidade, sabedoria e continuidade cultural.
Nosso Compromisso com a Educação na Língua Materna: Uma Jornada desde 2008
Desde 2008, temos nos dedicado a avançar na educação para crianças em situação de vulnerabilidade por meio de nossa iniciativa "Levando a Educação à Porta de Casa". Este projeto começou oferecendo aulas de alfabetização diretamente nos acampamentos de crianças mendigas não escolarizadas no Estado de Lagos, alcançando mais de 200 crianças, incluindo muitas meninas (55%) e aquelas com deficiências físicas ou graves dificuldades de aprendizagem. As aulas eram ministradas em Hausa, sua língua nativa, e em inglês, atendendo às suas necessidades educacionais imediatas, respeitando, ao mesmo tempo, seus contextos culturais.
Em 21 de fevereiro de 2020, em homenagem ao Dia Internacional da Língua Materna, lançamos um vídeo impactante defendendo os direitos educacionais de todas as crianças africanas que enfrentam marginalização—seja por estarem fora da escola, virem de comunidades nômades ou minoritárias, serem refugiadas ou ex-crianças-soldados. Este vídeo faz um apelo por uma educação inclusiva nas línguas maternas, garantindo que cada criança tenha acesso ao aprendizado em uma língua que valorize sua identidade cultural.
O vídeo sobre Educação na Língua Materna também destaca uma valiosa coleção de obras de estudiosos e especialistas africanos, oferecendo percepções e diretrizes para incorporar as línguas africanas nos sistemas educacionais. Visite nosso canal no YouTube para explorar esses recursos e junte-se a nós na promoção da educação na língua materna como alicerce para a preservação cultural e o desenvolvimento.
Abraçando as Línguas Africanas: Um Caminho para a Identidade, Unidade e
Progresso
Ao comemorarmos o Dia Internacional da Língua Materna, reflitamos sobre o poderoso papel da língua na formação da identidade, unidade e progresso. É hora de abraçar as línguas africanas, não apenas como meios de comunicação, mas como alicerces para o avanço econômico, social e cultural.
“Nação alguma saiu do subdesenvolvimento
por meio do uso de uma língua estrangeira pelo governo, a não ser que o
processo de aculturação tenha se tornado irreversível. Os africanos são
diferentes dos outros neste aspecto?” ~ Cheikh Anta Diop
Bunmi Awoyinfa
HOM
House of Mercy Children's Home Lagos,
Nigeria (HOM) é uma ONG comunitária dedicada a enfrentar questões críticas como
a fome infantil, a pobreza infantil, a falta de moradia infantil, o
analfabetismo infantil e a proteção infantil, ao mesmo tempo em que fornece ajuda
de emergência a crianças em crise em toda a África.